30 de setembro de 2012

Cópia cópia cópia


Livro: Estilhaça-me (2011), por Tahereh Mafi, publicado esse ano pela editora Novo Conceito.

Não sei se vocês se lembram da minha resenha d'O senhor da chuva, do André Vianco, onde discorro sobre a desprezível principiante capa do livro. Pois é, continuo achando que a capa é fundamental para o sucesso de uma obra, mas resolvi abrir uma exceção para o cintilante Estilhaça-me, de Tahereh Mafi, principalmente porque li o primeiro capítulo e me interessei bastante pela escrita poética da americana.
Sobre a capa: Ela me dá todos os motivos possíveis para não ler o livro. Brilhante, estampada com uma modelo totalmente desconexa e adereços como um QR Code, comentários bajuladores e frases de efeito sem efeito algum por todos os lados. Passei por ela com obstinação e me deparei com um ótimo pano de fundo, que consiste em um mundo distópico onde Juliette, uma garota de dezessete anos com o poder de desintegrar pessoas, foi trancafiada por causa de um assassinato que cometeu por causa de sua curiosa habilidade. O Restabelecimento — o governo vigente dessa distopia , então, resolve usá-la como instrumento de tortura. Isso, no entanto, acaba não se concretizando para que ela fique de melação com Adam, um dos soldadinhos de chumbo do Estado, e daí para frente tudo despenca ladeira abaixo.
Mafi, em meio a uma narrativa envolvente, mas repleta de comparações barrocas demais, se utiliza de três inusitados recursos para que sua marca fique impressa nos cinquenta capítulos: Um deles é o costume de tachar a fonte (ou seja, riscá-la ao meio) quando o conteúdo das palavras escritas se refere aos pensamentos mais sem nexo profundos e insanos de Juliette. O segundo é subitamente esquecer de colocar pontuação em frases e parágrafos inteiros para que ideias diferentes sejam expostas como a de velocidade ou a de afobação ou a do que você quiser para aumentar essa frase o bastante para que você não consiga lê-la normalmente pois isso é o que acontece em Estilhaça-me. O último recurso é o de repetir palavras palavras palavras para que intensidade seja expressada. O primeiro funciona muito bem, embora às vezes seja utilizado sem necessidade; o segundo faz Mafi parecer um demente escrevendo; o terceiro é totalmente desnecessário. Menos de trinta por cento de aproveitamento, aproximadamente.
Não vou entrar no mérito da pieguice de um romance para jovens adultos (Young Adults, ou YA, termo muito usado recentemente para séries infanto-juvenis como Crepúsculo e Os instrumentos mortais) pois isso o Felipe Neto já abordou muito bem em um de seus vídeos e, bem, dizem por aí que ele é intelectual. Nem vou me ater tanto aos abusivos defeitos narrativos do livro, como Juliette ainda ser atraente como a Jessica Alba mesmo depois de anos encarcerada sem alimentação e higiene adequadas ou a conveniência do mocinho e do vilão serem imunes ao poder desintegrador da protagonista: Citá-los já é o bastante para você repudiar Estilhaça-me, presumo. O que me preocupa é a falta de originalidade.
Vamos lá: Romances para jovens adultos com capas espalhafatosas estão se tornando uma epidemia tendência, e isso é o de menos. As pessoas gostam tanto desse tipo de narrativa que a 20th Century Fox comprou os direitos cinematográficos de Estilhaça-me antes mesmo do livro ser lançado. O grande problema, ao meu ver, são as tantas ideias reusadas em tão curto espaço de páginas. Um mundo destruído, dominado pela pobreza e pela intolerância política? 1984. Uma congregação de pessoas excluídas da sociedade por seus poderes? X-Men (Já ouviu falar do Decompositor? Pois é. Juliette é a mesma coisa). Uma protagonista jovem que se sente atraída sexualmente por qualquer homem que apareça à sua frente? Na cama com Bruna Surfistinha (tudo bem, foi uma piada). Mesmo assim, a Bella de Crepúsculo não deixa nada a desejar quando o assunto é passar pelas mãos de vários homens. Será que é isso que o mundo inteiro tem a oferecer literariamente? Uma cópia descarada do que já estamos cansados de ler?
Quer dizer, eu estou cansado. Pelo visto tem muita gente que adora chover no molhado.
Tahereh Mafi já disse que nunca viu, nem comeu, e só ouviu falar de X-Men e que a inspiração para os poderes de Juliette vieram da capacidade humana de superar obstáculos, ou alguma coisa clichê como isso parecida com isso. Justifica? Não. Não é porque eu tenho uma ideia que ninguém a teve antes. A internet está aí para isso, para que conheçamos o que já produziram por aí e para que não acabemos em um involuntário plágio.
"Não há nada de novo sob o sol", já diria o livro de Eclesiastes, e quem se arrisca a contrariar a Bíblia nessas horas? A originalidade está longe de fazer sucesso nos dias de hoje, e sim, vamos ser submersos em fotocópias do passado até que demos um basta. Será que daremos?, essa é a pergunta. Estilhaça-me é a primeira parte de uma trilogia e teremos reciclagem de Orwell e Stan Lee até 2015, no mínimo. Até lá dão um jeito de fazer com que O alquimista de Paulo Coelho ande em um deserto infestado de zumbis ou qualquer outra ridícula releitura de alguma obra que possa dar dinheiro fácil às editoras oportunistas e a Hollywood.

Moral da história: Nunca confie em livros com capas brilhantes.

Aposto que você não sabia que... Estilhaça-me tem um trailer que consegue ser pior do que sua capa. Irrite-se Curte aí!

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