3 de outubro de 2012

"Oh, lady."

Foto original: http://goo.gl/uEalx

    Oh, lady.
    Pensei que não viria mais: Ensaiei essa música para você. Comece a dançar, por favor, isso. Uma nota por vez, devagar, mexa esses fartos quadris que Deus te concedeu em um dia feliz. Isso mesmo. Esse piano velho sentiu saudades de seu molejo. 'Tá rangendo de amores por você.
    Eu sei, pode falar, lady. Atrás dessa porta esconde-se a danação do mundo, e estamos prestes a sumir no apocalipse bíblico. Só quero que você dance, movimente essas coxas como se elas tivessem sido criadas para essa música. Com amor, isso. Com paixão, ofereça-se à melodia porque ela te pede. Te anseia, te implora para meus dedos enfraquecidos pelo tempo nada misericordioso.
    Enquanto você se lambuza na música, eu sei, você fala sobre todos esses governantes que vieram da mesma fábrica de pólvora. Não quero saber. Quero sua dança, seu corpo cansado de tanta devoção. Danem-se todos os engravatados que exalam o mesmo cheiro de maldição: Eles não dançam como você. Eles não requebram como você. Não acredite que um dia mudará qualquer mundo além do meu.
    Oh, lady. Senti, sinto, sempre sentirei imensas saudades dessa melodia remexendo suas maliciosas pernas. Seu quadro em minha parede me lembra tanto de seu sorriso ingênuo, suas unhas sempre esmaltadas com perfeição, esse narizinho arrebitado de mulher importante. Vejo-os todos à minha frente, dispostos em inigualável harmonia, fazendo o Inferno lá fora parecer irrelevante como a margarina fora de seu lugar na geladeira.
    Não sei até onde vão essas saudades, mas elas me fazem tocar essa música de novo. E de novo. E de novo. E... de... novo... até dormir. Até eu sonhar com você e acordar chorando porque foi só um sonho e você se foi. Foi-se, ceifada pelas agigantadas mãos do nosso triste fado. Uma vítima, como todos, como o planeta inteiro.
    Oh, lady. Se você soubesse quantas pessoas estão sozinhas aqui embaixo, você daria um jeito de simpatizar com os anjos e conseguir um dia comigo, com o dono do bar — não soube? A mulher e os filhos dele também se foram —, com sua irmãzinha, 'tadinha, jogada em um celeiro, sendo cuidada em meio a tufos de feno, cavalos e galinhas.
    Ainda te vejo dançar. Seu rosto já não exibe a celestial feição de outrora, mas você requebra como se nada pudesse te abalar. Sua frio, vejo as gotas sulcando seu corpo esculpido em moreno mármore. Mande ver, vamos: Não tenho muito tempo. Estou só, estou amargurado e meu coração ameaça se estilhaçar como uma "xicrinha de vidro", como você falaria. Sua desmazelada. Misérrima. Malcriada. Mas ainda te amo, sempre te amei. Desse jeitinho aí, dançando com toda sua má-criação a ser exibida por esses peitos, essas pernas, essa vida inteira.
    Oh, lady: Estou tão fraco... Pode ir, se quiser. Acho que vou-me deitar um pouco. Só um pouco. Só... um... pouco... até dormir. Até eu sonhar com você e acabar não acordando mais.

Um comentário:

Anônimo disse...

Um texto tipicamente juvenil, de um aspirante a escritor que leu meia duzia de livros também tipicamente juvenis.