10 de outubro de 2012

HipocR$ia

Foto original: http://goo.gl/GoRo6

"Você consegue colocar um preço na paz?"
Peace Sells, por Megadeth.

As formigas (R$0,15 a unidade), em sua implacável trilha, ameaçam o bolo de laranja (R$2,99) que acabei de comprar na padaria. Espano-as com a ponta de meus dedos e elas acabam desistindo. Corto um pedaço do bolo, coloco-o em um pratinho de sobremesa (plástico, R$4,00) e sento no sofá (camurça, na cor marfim, conjunto de dois e três lugares por R$749,99 na promoção daquela segunda-feira) para assistir um pouco de televisão (de tubo, 14 polegadas, R$349,00). Esportes? Não. Há muito dinheiro desnecessariamente envolvido nisso. Desenhos animados? Não. Meses de dinheiro para quinze minutos de risadas amarelas. Ah, Economia. Como vai a NASDAQ? E a seca nos Estados Unidos, vamos realmente ter uma baixa na importação de salsichas (R$7,99 o pacote)?
Minha esposa (48x sem juros de R$1.999,00) desce as escadas deslizando suas felpudas pantufas (R$99,99) pelos degraus. Acena um descompromissado "oi" para mim e, depois de ir à cozinha, senta-se ao meu lado com um naco do bolo de laranja. Logo sobe as escadas de volta ao perceber que, sim, estou de novo no canal de economia, pois sim, o mundo é um grande produto.
Não temos filhos, são caros demais (Entrada de R$5.999,00 + 60x de R$800,00). Tampouco um animal de estimação, cujo preço nem penso em estimar. Falo para ela o quanto deveria ser feliz por economizarmos e termos uma vida digna mesmo assim, pois veja quantas pessoas por aí gastam importantes cédulas com telefones celulares (de R$100,00 a R$1.500,00, aprox.) quando temos o eficaz serviço de correios (R$2,00 em um envio normal), ou preferem a regalia de uma marca internacional de refrigerantes (2L por R$4,00) em detrimento de marcas brasileiras (os mesmos 2L por R$1,99, isso quando não vêm grátis em promoções de pizzarias) que suprem a vontade de algo líquido, gaseificado e doce na boca. Essas pessoas não são felizes, você pode constatar. O sobrenome delas é Consumo Desnecessário, e isso traz amargura ao coração e ao bolso mal administrado.
Veja eu (48x de R$2.499,00), por exemplo: Vivo na mais extrema e abundante paz (tratar com a gerência) sem precisar me entregar às transnacionais ou ao consumo indevido. Há mais de trinta anos minha sobremesa consiste em wafers (R$1,89 o pacote com vinte unidades), enquanto muitos perdem tempo com caixas de chocolates (R$7,50 — a marca popular, claro) ou até mesmo, ah, que desperdício, ovos de páscoa (R$9,99) ou mordomias absurdamente inválidas. Isso é só um de inúmeros exemplos, aliás: Acho que as pessoas têm que aprender a utilizar sabiamente o dinheiro que recebem de seus suados ofícios. O gasto desenfreado é o culpado pela ansiedade, pelo estresse e pela depressão tão recorrente nas mais novas gerações trabalhadoras.
E eu sei que pode soar estranho, afinal simplesmente comecei a falar sobre esse assunto. No entanto, tempo é dinheiro, e cada uma das até então quatrocentas e setenta palavras desse texto está me custando cinquenta centavos. Espero que você siga os conselhos de uma pessoa feliz como eu. Até logo!

(esse texto custou R$248,50 para ser produzido, sem os custos extras do título e da epígrafe)