16 de agosto de 2012

T.R.T. (Ou Uma receita para o ódio)

Quando eu nasci, um anjo doido me disse:
“Viverás no lugar errado pra fazer a coisa certa”.
- Cacau Gomes, poeta pernambucano.

            Há quanto tempo estou assim, esperando a verdade como se ela fosse ser deixada na caixa de correspondências como uma carta de cobrança? Verdade é cobrança, afinal. E são poucos que a pagam. Se ela viesse discriminada ali, junto dos impostos que pagamos em nossas refeições, nosso lazer, nossas necessidades, talvez fosse mais fácil sermos verdadeiros.
            Chega uma hora em que nem eu sei se o que estou falando é verdade, e quando chega essa hora parece tarde demais. Finco os pés no chão e não saio daquele tempo-espaço até eu conseguir acender uma luz no fim do túnel (pois cansei de esperar que ela fosse acesa ou estivesse lá sem esforço algum). Do fundo do poço até o fim do túnel, inúmeras vezes. Crise de meia-idade tendo nem um quarto de idade que se preze.

            Sensações boas, então: Prazer cujo preço pago vale a pena sem o menor ressentimento. Tudo pelo prazer e nada pela verdade. Até evito pensar na verdade para que eu não me pegue mentindo para mim mesmo. E aí me entrego ao prazer, à facilidade, pois uma hora cansa ver só dificuldades pavimentando a trilha. A verdade é difícil, difícil como se desapegar das coisas vis e microscópicas que se entranham na gente e crescem e tomam das nossas mãos o controle de nós mesmos. Difícil e às vezes impossível. Uma questão de estado de espírito. A vida parece um fácil jogo-da-velha quando estamos sob o efeito da endorfina.
            Aqui noto que estou sendo pessoal demais, e peço desculpas. Vocês não precisam ler isso, podem ir embora, é desinteressante demais. Vão. É perda de tempo me ouvir falar dessas coisas tão irrisórias para suas vidas. Vão, me deixem falando sozinho que uma hora eu juro que paro. Vão. Pois bem. Já contei sobre as histórias mal acabadas? Parece-me que estão escrevendo as histórias da minha vida sem me consultar. De verdade, tenho opiniões diferentes sobre meu passado, presente e futuro: Deixem-me palpitar! Dar uns pitacos, talvez. Puxar a alavanca e mudar os trilhos de direção, botar minha vida sob meu controle.
            Estarei onde eu nunca mais poderei estar.

            As pessoas dizem muitas verdades, no fim das contas. Só não dizem para as pessoas certas. Cospem essas verdades em outros que não têm nada a ver, e de repente estamos todos enovelados em uma severa rede de verdades, onde o que importa é desviar a verdade de seu curso natural. A mentira, então, se torna ingrediente indispensável em nossa receita para o ódio. Todos nos tornamos titereiros do mundo todo, menos de nós mesmos. Guiamos a vida dos outros pela verdade, e a nossa pela mentira. A mentira, então, nos leva por becos escuros e vielas cheias de lixo, por pântanos hostis e oceanos violentos. A verdade mal guiada também é uma mentira, ou pelo menos se torna uma.
            E a omissão? Quem hasteou a bandeira da omissão como se fosse a dipirona sódica da mente humana? A sensação de que sempre há coisas sendo escondidas de nós é uma bandeira mais raivosa e amaldiçoada do que a bandeira preta dos piratas. Isso sem esquecer como omitimos informações valiosas de nós mesmos, como se elas nunca fossem voltar para nos assombrar.
            O que pensam da gente? O que pensam de mim? Ah, que agonia. Ninguém quer dizer, e quem diz é odiado. A verdade nos tornaria melhores, não é? Todos dizem isso. Mas meus pais omitiam coisas dos outros. Melhores amigos falaram pelas costas de pessoas que amei. Melhores amigos também falaram pelas costas uns dos outros. Vi isso tudo, ouvi isso tudo, e já estava sendo comandado pelas verdades alheias a mentir. Ah, que vítima eu sou. Ah, como vou me autoflagelar e botar a culpa nos outros. Ah, que atitude insignificante e infantil.
            Não posso ser assim, não posso continuar sendo assim. Viver sem saber o que é verdade e o que não é: Isso é o legado de uma geração para a próxima? A omissão se tornou algo bom – não somos merecedores da verdadeira confiança por puro capricho nosso.
Vítimas e algozes todos nós somos: A vida, por instância, é a escolha entre um ou outro papel. E essa, acho – não tenho certeza alguma e, como vocês chegaram até aqui, digo-lhes que não sei nem o porquê disso tudo ter sido dito –, é a verdade. Mas quem sou eu para falar o que é verdade e o que não é?
Quem sou eu?
Quem? Eu?
Ah, não sei de nada.

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