14 de novembro de 2012

Talvez-fábula

Foto original: http://goo.gl/DM5Y4

Eles se conheceram às duas frias horas da madrugada de um sábado para domingo. O loiro tinha uma pequena gaivota tatuada na nuca lisa como vidro recém-moldado e o careca adornou seu antebraço direito com uma coruja assombrada que parecia observar além do horizonte com suas orbes amareladas.
     Apaixonaram-se. O loiro e o careca; a gaivota e a coruja. Demoraram a se entender, no entanto: Um queria ver o pôr-do-sol, o outro só conseguia viver à noite. Aquela madrugada havia sido uma exceção e, portanto, não se repetiria tão cedo ao lado da corujona atenta.
     As coisas só pioraram dali para frente. O amor, sentimento tão humano, complicou a vida das aves, que só sabiam se desentender quando uma visitava a casa da outra — e a outra visitava a casa da uma, claro. Não partilhavam dos mesmos gostos culinários e televisivos; um era filme de romance, o outro era terror. Um era cama desalinhada, cabelos desgrenhados e visual eterno de "acabei de acordar", o outro organizava os livros de acordo com o tipo do papel.
     E, afinal, um era gaivota e o outro era coruja. Isso nunca daria certo.
     Poucos meses passaram até o óbvio fim. Um deles voou rumo ao sol, o outro se empoleirou no seu canto até sua caça predatória noturna. Nunca mais se encontraram. O amor acabou se desencontrando no caminho, e eles nunca mais encontraram alguém como suas antíteses tão convidativas.
     A gaivota, de tão infeliz que estava com a vida, começou a se realinhar, transformando sua residência em um hermético arquivo computadorizado que paticamente se organizava sozinho. A coruja se entristeceu com sua própria situação, enquanto isso, e vadiou até seu lar estar ensebado e rançoso como uma mina abandonada.
     Mas o equilíbrio estava ali: No amor desencontrado.
     E, infelizmente, para sempre perdido.
     Talvez, na insônia de um ou na pressa do outro, eles se reencontrem. O que não quer dizer que vão reencontrar o amor.


     Fim.

Moral da história?
Amor é pássaro livre. Bicho que voa. E vai embora. E não volta.
Engaiole o amor em seu coração antes que ele se perca nos ventos do tempo.
Para sempre.