4 de julho de 2012

Espelho torto

São três e meia da tarde.  
Eu acabo de acordar como uma máquina que depois de muito tempo desligada recebe uma carga elétrica sendo despertada a força.
Dez minutos.
Não quero apenas dez minutos a mais, tudo que eu quero é a eternidade.

O delírio da ausência de luz logo se desfaz enquanto abro uma fresta na janela e observo os raios solares invadirem meu quarto, parece que eu dormi por uns três dias seguidos, jogo o cobertor para o lado e não resisto ao odor carregado do abismo, o qual eu chamo de vida. Por um segundo algumas imagens completam minha mente, bebedeiras, som alto, beijos sem amor e novamente o vazio, o silêncio.

Balanço a cabeça, três vezes evitando o caos do pensamento, levanto e vou em direção à porta, tomando cuidado para não pisar em nenhuma lata de refrigerante, caixa de pizza e outros restos que estão definhando em meu quarto, paralelo a minha condição mental e espiritual, esse lixo é tudo que me convém.

E meu primeiro pensamento pela manhã é: Onde está ela?
Coloco uma camiseta xadrez surrada e com marcas de molho de tomate na manga. A casa está vazia, o silêncio no começo era bom, ontem foi enlouquecedor e hoje é meu único amigo. Mentira Velho Jack eu não falei sério. Preciso mudar esta vida, recrio a decisão utópica na minha cabeça.

Quando você está triste, todo mundo pode superar seu problema. Acho engraçado, todos me perguntam se eu não quero mudar, é óbvio que eu quero sair dessa. É como perguntar para um obeso mórbido se ele não quer emagrecer.

E ninguém entende, nem sequer se fazer força para, não os culpo, pois não se pode mensurar a dor de perder o que era o mundo inteiro para você, e quem tentar mimetizar tal sentimento nunca chegará em uma quantidade exata proporcional de dor.

 Infelizmente essa dor foi maior, tão maior que me levou para o fundo do poço, onde nenhuma tecnologia pode me salvar, tão profundo que nem uma oração pode me resgatar. Onde talvez eu não queira ser resgatado. Quando eu disse o último paragrafo, quase todos me odiaram. Até eu me odiei. Mas então me responda bom senhor, como eu posso viver quando a melhor parte de mim está enterrada a sete palmos debaixo da terra junto com os familiares dela?

Ligeiramente a colher de prata despenca da minha mão, e seu tilintar me faz terminar meu dialogo diário com o espelho torto da cozinha, acabo de misturar o refrigerante barato ao gin, degusto a bebida com duas pílulas para dor de cabeça, logo em seguida mordo o sanduiche de queixo mofado sobre a pia, enquanto espero,  como um paciente de câncer espera sua morfina, o fim e nada mais.

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Abraços para quem sobreviver ao apocalipse corintiano hoje. 
do Marceneiro

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