11 de novembro de 2011

Show da fé

Anteriormente na Cidade Rex: Mínima Ideia: Você se lembra?



“ Há um caminho que ao homem parece direito, mas o fim dele são os caminhos da morte “

- livro de Provérbios: 16:25


O sol decaía na Cidade Rex, como em toda cidade normal pessoas procuram sua diversão, seja pelos bares lotados ou fortificando sua fé. Hoje o protagonista da nossa história é ninguém mais ninguém menos do que o Pastor Walter. O resumo de seus dias é esse: Era uma criança conturbada, não recebia nenhum tipo de atenção de seus familiares, então pensou que ao estudar a bíblia ganharia atenção da mãe, não deu certo, mas de tanto se aprimorar foi crescendo de posto em uma famosa igreja, sua única forma de escapar da realidade, lá era conhecido como o grande profeta, pois sua fé era capaz de verdadeiros “milagres”.
 
Walter não sabia muito sobre artistas, porém seu show dava de dez a zero em muitas peças de teatro, o esquema era totalmente combinado antes os artistas bem pagos, efeitos sonoros revisados tudo pelo pessoal de confiança desse jeito todo demônio que Walter fosse encarar ali voltaria para o inferno com o rabo entre as pernas. 

Seis horas e trinta minutos, as trombetas celestes soavam, a casa estava cheia todo mundo ali carregava um problema, uma tristeza pessoal, mas Walter não se importava tudo seria resolvido caso o sacrifício fosse aceito pelo “Altíssimo”. O altar esplandecia uma chama milagrosa, os olhares comovidos enquanto o Pastor propagava sua milagrosa fé ao centro dos palcos ele berrava as palavras de “Deus” , pois era a ponte entre deus e o povo, melhor que ninguém sabia as vontades de Deus e seus desejos, o que? Amor incondicional, benevolência e empatia? Nada disso, era 10% e o que você tivesse no bolso. Tudo pronto, o falso demônio posicionado seus berros de terror assustavam as velhinhas que oravam fervorosamente na primeira fileira ajoelhadas. Walter então bradou seu discurso, deixando sua voz onipresente ecoar: 
— Você demônio maldito das profundezas, não temos medo de você volte, pois seu período de farra aqui acabou! 
Enquanto fazia o sinal da cruz firme sobre o peito, apontava para a criatura que urrava umas palavras estranhas. Pegou uma bíblia e começou a rezar, no final a artista fingiu um desmaio e foi retirada de cena pela equipe de profissionais competentes. O povo clamava por Walter ele é um herói, a imagem de líder fortificada a cada demônio derrubado, não perdeu a chance enxugou o suor do rosto e voltou a falar:
— Não existem barreiras para o poder do senhor, sua dor, seu medo ele vai tirar pode ter certeza, mas apenas quando você olhar para o seu coração, meu irmão e irmã, apenas quando ele estiver satisfeito com a pergunta: Eu me sacrifiquei o bastante para receber essa benção?
Walter sabia, para a consciência humana imersa em vontades e pecados nunca era o bastante. Nunca, sempre iria um botãozinho ativar fazer soar pelo cérebro o alarme: “Mais, mais, mais não é o suficiente!” Enquanto o rebanho do Senhor organizava uma fila para colocar as oferendas no altar, Walter os auxiliava falando uma ou outra palavra de conforto, fingindo que se interessava pelos problemas alheios, pois um bom pastor nunca abandona suas ovelhas. Quanto o show terminava por volta das oito e meia da noite, o bom pastor se reunia com a produção, contabilizavam a coisa toda e partiam para a organização do dia seguinte, como dizem “O show precisa continuar”. O pastor não achava errado o que ele fazia, apenas sobrevivia da forma que melhor se adaptou como a maioria dos humanos costuma fazer. O único medo de Walter era a vida depois da morte, sabia que queimaria no fogo do inferno pelos incontáveis séculos que estão por vir. Tudo pronto, mais um dia terminava, porém o destino é engraçado, Walter saia da igreja em passos calmos refletindo sobre suas ações, na verdade ele era um cara cansado de tudo, do falso orgulho, de sobreviver enganando as pessoas, de brincar com o que é sagrado. Todos esses fatores o faziam suspirar de dor, andou sorrateiro até o estacionamento nenhuma viva alma no local quando de repente um homem encapuzado surgia das sombras correndo em alta velocidade disparando sua arma em várias direções, o religioso largou sua maleta assustado, no instante seguinte foi atingido em cheio por duas balas no estômago. Caiu de joelhos enquanto seu sangue fluía como um rio bateu a cabeça no chão, respirar estava se tornando uma tarefa difícil, cada segundo estava cada vez mais atordoado se afogando no próprio sangue. Olhou para o horizonte logo após e viu um velho fantasiado de mosqueteiro caminhando em sua direção empunhando um mosquete para o alto como um vingador, pensou “Pronto, estou no inferno vou pagar meus pecados agora” Era um velho de quase dois metros, que olhou para a ferida do homem caído, fez uma cara feia e segurou a mão do homem dizendo:
— Vai tudo ficar bem filho, vai tudo ficar bem! 
A ambulância estava a caminho, porém já era tarde demais todos os sons estavam se confundindo com a promessa falsa do velho. Walter fechava os olhos, e dessa vez ele sabia que era para sempre. O corpo ficou ali, deitado no chão frio acompanhado por um velho com Alzheimer que na próxima hora iria se esquecer do acontecido e continuar com sua vida de vigilante. Mas o que estava acontecendo? Abria os olhos novamente estava em um local totalmente imerso em trevas, porém não existiam demônios, ou torturadores era apenas a escuridão. O som do silêncio era perturbador, saber que em um universo inteiro só você estava ali. Walter sentia-se abandonado por suas crenças, onde estava Deus?  Onde estava o diabo? Ali só existia o silêncio que era perturbado constantemente pelas gargalhadas da mente conturbada do Pastor, o qual alternava seu corpo encolhendo-se no infinito da loucura.


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Não existe fé ou dogma que justifique isso:




O bispo insiste: "Você vai vender?". A criança diz que sim, e Guaracy pergunta, referindo-se ao dinheiro: "Pra colocar onde?" "No altar", promete a criança. (...). E conclui: "Seja fiel, vende o que você tem. Tem fé pra isso? Vai na tua fé". (...)



A religião é que deve servir os homens e não ao contrário.




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