9 de agosto de 2013

Home sick home (momentos a sós, parte 2)

Detalhe da capa de "Album of the year", do Faith No More.

      Momento 1
      Uma paixão por dia. É assim que segue a vida volúvel de um solteiro que quer ficar nessa condição. É amor intenso que acontece entre vinte e quatro horas, pois não se sabe como será o amanhã.
      Cada conversa no ônibus é tratada com a voracidade de um arranca-roupas do bom e velho entra-e-sai. Cada olhar que se encontra é certamente uma nova oportunidade se abrindo feito leque.
      A sensação de um dia após o outro é latente quando se está só.
      Porque quando se está só, a luta para encontrar alguém é constante, é o leão de cada dia. Acordo sozinho toda manhã e me preencho do fogo das amostras grátis de amor. Chega a noite, o calor do Sol se vai assim como o calor desse mesmo fogo, e a cama é um aparato vazio, quase a forma sólida da melancolia.
      (Com sorte dá para arranjar um "boa-noite", e aí o colchão se torna um pouco mais morno.)
      Mas isso não é ruim, e faço dessas palavras de Gustavo Gitti as minhas:

"Observe o que acontece em um banho gelado. Ao enfrentar uma temperatura mais baixa, em vez de receber, geramos calor. O desconforto ativa aquilo que sempre esteve presente: nossa própria fonte de energia, calor, intensidade, tesão, potência, amor, paixão, segurança, confiança. O frio nos ativa, desentope, esquenta."

      Eu odeio inverno e ainda tomo aquele conhaque para enfrentá-lo. Mas o frio interno é combustão plena.

      Momento 2
      Estou escrevendo para mim mesmo e foda-se.
      (Ai, como sou rebel rebel.)

      Momento 3
      Hoje peguei o ônibus errado pra parar no lugar certo: Na rua de sua casa. Não é a primeira vez que faço isso e não será a última. É um pouco doentio, sim, assumo, mas é doença crônica, daquelas indissociáveis de nós. A cegueira de Stevie Wonder, a má-formação das orelhas de Paul Stanley, a dislexia e o DDA de Ozzy Osbourne: Coisas que não saem de nós nem se sairmos delas.
      Saí de sua casa, mas ela não saiu de mim. Deixei você, mas você não me deixou.
      Lar, doente lar. Ele é a minha cura.

      Momento 4
      Coloco a mão no bolso e sinto que ele está mais vazio: Desperdicei um "eu te amo". Foi para a pilha de descartes, mas talvez alguma carta de efeito a coloque de volta ao jogo.
      Mas é algo que pedi, quase ajoelhei e implorei para os deuses, e essa constatação piora tudo: Não se dá algo para quem não quer receber. O presente fica ali, à porta da casa, abandonado feito bebê na cesta. Apodrece feito fruta na cesta. Some feito marido na sexta. Tem gente que é muito melhor sozinha, e tenho que conviver com essa informação.
      É o que resta, pois gente assim é um porre.
      Um porre que tomo com prazer quando quero dormir num sofá vazio no fim da noite, quando a noite acaba ao meio-dia e o tempo deixa de existir (então dane-se esse meio-dia aí).
      Tudo está de cabeça para baixo e meu bolso se esvazia. Prometo a mim mesmo que a próxima jogada será mais, hã, prudente.