14 de abril de 2012

Últimas palavras

(Encontrado no criado-mudo por sua esposa)

“Meu amor.

Já não tenho mais tanto tempo. Sinto isso há anos, mas agora parece definitivo. Tivemos os lábios da eternidade nos beijando, mas estamos velhos demais para pensar no futuro.
(Às vezes acho que você já cansou desse meu jeito de escrever, desses parágrafos inteiros entre parênteses e coisas assim, mas é o que posso te dar. E espero, muito, que não tenha cansado.)
Incrível como conseguimos ser eternos diante de tanta inconstância. Altos e baixos nos permearam nesses mais de cinquenta anos, mas lá no fim sempre existiu o sentimento que nos fazia compreender tudo e amadurecer cada vez mais. Chegamos onde muitos nem pensam em chegar, e desde que nos conhecemos cada dia de minha vida ganhou inestimável importância.
Construímos um mundo só nosso, com vidas que criamos e lugares que frequentamos. Tornamo-nos uma entidade, uma instituição pavimentada com pura paz e amor. Tudo, absolutamente tudo, valeu a pena.
Antes de partir, só queria deixar bem claro que te amo. Te amo com o mesmo fervor da mocidade, com a mesma responsabilidade da vida adulta e com a mesma ternura da velhice que agora nos pertence. E, mesmo que me reste pouco tempo para essas últimas palavras, ainda gostaria de fazer um desejo. Pode até ser egoísta de minha parte, mas... estou partindo antes de você, e tudo que sempre quis foi ficar do seu lado o máximo de tempo possível. Assim, meu último desejo é estar, pelo menos em sua mente, com você em seu último fôlego, como estive do seu lado por toda minha vida.

Adeus.”

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