3 de julho de 2011

Uma vida inteira pela frente

Conto inspirado em: KISS - Beth (letra)


(Primeira ligação, às dez horas da noite.)
O celular toca mais de oito vezes, mas nada dele. Beth, de camisola no sofá da sala, repousa o telefone no gancho e se encolhe no assento tentando se aquecer do vento frio da solidão.
Ela tinha uma vida inteira pela frente, mas resolveu se casar o mais rápido possível. Tinha medo de se tornar velha demais e não ter um homem que a amasse quando tivesse quarenta e tantos anos e rugas o bastante para deprimir uma mulher. Ela tinha vinte e cinco anos e nenhuma ruga, mas mesmo assim seu homem não a amava.



(Segunda ligação, às dez e meia da noite.)
Depois de seis toques, o celular foi abruptamente desligado. Beth orava para que seu marido não tivesse feito isso. "Pode ter sido um dos amigos dele, talvez eu esteja atrapalhando algo importante", ela pensava com inocência.
Foi ao banheiro, passouu creme nos longos cabelos negros e no rosto sedoso. Com seu hálito quente, fez uma pequena nuvem esbranquiçada no espelho e com o dedo desenhou um coração. Sorriu ao ver o músculo do amor, e foi embora antes dele desaparecer com o ar gelado. Não queria ver seu amor ir embora.

(Terceira ligação, às onze e quinze da noite.)
Ele atendeu. Disse que não poderia ir para casa naquele momento, estava jogando pôquer com alguns amigos. Prometeu que já estava de saída, e antes da meia-noite estaria em casa, mas logo desligou quando os tais amigos o chamaram. Terminou a ligação dizendo o que ele podia fazer.
"O que você podia fazer?", pensou Beth. "Você podia voltar para casa, me dar um longo beijo na boca. Podia me dar alguma satisfação quando fosse sair com seus amiguinhos. Podia me trazer um agrado de vez em quando, nem que seja um bombom. Podia lembrar que tem uma esposa."
Mas Beth nunca falava essas coisas. Preferia guardar no buraco negro dos seus olhos vazios.

(Quarta ligação, à meia-noite e três.)

"Você sempre está aí, falando que se sente vazia, que nossa casa é o seu inferno", ele começou a gritar. Já estava bêbado. "Eu tou sempre em algum lugar e você fica aí sozinha em casa. Por que você também não sai, vai conhecer gente nova? Por que depende tanto de mim? Por quê?"
Talvez porque ele era o marido de Beth, mas isso não vinha ao caso. Ela já não queria mais saber de justificar sua desgraça. Desligou o telefone e desatou a chorar, com a cabeça debruçada nos joelhos. Sua alma morria a cada dia com esse homem.

(Quinta ligação, à uma e sete da madrugada.)

Essa ligação foi dele. Disse que sabia que Beth estava sozinha, e estava muito triste com isso. Disse também que sabia que ela ficaria bem. Finalizou falando que ficaria jogando com seus amigos a noite inteira.
Depois disso, Beth resolveu dormir. Tomou seus calmantes, deitou na cama e fechou os olhos.
Sonhou com um homem que a amasse. Sonhou com um homem que não a fizesse sangrar. E aí, nunca mais conseguiu acordar para a realidade. O que mais Beth podia fazer? 


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Devem ter alguns erros de digitação aí, se tiver me avisem .
E quem tiver uma proposta de emprego aí, também avise.
Bye, galere! 

                

Um comentário:

AssiZ de Andrade disse...

nossa, que triste.
Mas, analisando friamente, a culpa dessa situação é só dela. Ele está certo em viver, casamento não precisa decretar a morte de ninguém. E pelo que vi, nem mesmo é machista a ponto de achar que aquela disposição entre homem e mulher era a mais adequada: ele se diverte, ela sofre.

Beth, pelo que notei, é uma covarde. Tem medo de ficar só, tem me de ser arriscar. Tem medo até de dormir por si só.
É uma moderna num mundo pós-moderno. Precisa avançar e lembrar que as barreiras do mundo real já não limita ninguém.

Abraços!

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